segunda-feira, 6 de julho de 2009

Carta de Carlos Domingos a Tomas Lorente

"TOMÁS LORENTE foi meu mentor, minha principal dupla, um amigo querido,exagerado e carinhoso. Como todo espanhol, era intenso: amava intensamente, odiava intensamente.

Eu vivi esses dois lados.

Com ele ganhei todos os prêmios da publicidade, alcancei as maiores glórias. Vivi uma relação de amor raramente vista entre homens. Fomos irmãos mesmo: criávamos juntos, almoçávamos todos os dias, bebíamos até tarde (muitas vezes, contra a minha vontade: ele não me deixava ir embora).

Vivemos as maiores emoções juntos. Nossas irmãs fi caram doentes ao mesmo tempo, nossas mães foram operadas no mesmo período. Chorávamos um no ombro do outro. Viajávamos juntos (é verdade: tirávamos férias e íamos para os mesmos lugares).

Convivi tanto com o Tomás (ele sentado sempre ao meu lado direito) que certa vez fui fazer um exame médico e o doutor me disse que eu tinha uma mancha de nicotina no pulmão direito, acredite se quiser! Ralhei com ele várias vezes para maneirar no cigarro (eram 3 maços por dia), menos preocupado com a saúde dele do que com a minha. Ele dizia, com grande dose de razão, que os gênios fumam. Sim, Tomás sabia que era um gênio.

Quando saí da DM9, num gesto nobre - que demonstra bem seu caráter e lealdade - ele saiu comigo. Abandonou uma sociedade numa bem-sucedida agência simplesmente para me acompanhar. Em menos de 24 horas, juntamente com a Ana, decidimos abrir a age.

Alguns anos depois, quando deixou a age., experimentei o outro lado. Tomás me odiou com todas as forças, se empenhou em tirar o pessoal da criação, e tirou mesmo. De todos os lados, ouvia demonstrações de sua dor, rancor e ressentimento. Foi um período muito difícil. Na inauguração de seu restaurante (que acompanhei cada detalhe, íamos lá toda tarde), mandei flores para tentar amainar as coisas. Não adiantou muito.

Claro que voltamos a nos falar, mas nunca mais foi como antes.

Apesar de nosso afastamento, sempre continuei ligado a ele. Eu sabia quando ele não estava bem. Nas semanas que antecederam a saída dele da Y&R, sonhei com o Tomás três vezes.

Na fatídica noite de seu infarto, não preguei o olho: tive taquicardia, dores pelo corpo, algo me incomodava e me impedia de dormir. De manhã, soube o motivo: ele estava se despedindo.

O mercado perde um gênio, um Midas. O mundo perde um sonhador, um homem que flertava com a excelência em tudo que fazia. E eu perco um irmão com quem, para piorar, não havia retomado a amizade por completo (ah, isso ainda vai doer muito).

Para meu consolo, há uns 15 dias, minha esposa encontrou com ele num shopping. Se falaram, o Tomás viu as fotos de minha filha pela primeira vez. E a Fernanda, que sempre soube de meu sentimento por ele, verbalizou:

- Tomás, o Domingos gosta muito de você. Mas gosta mesmo: sempre que fala de você, seus olhos enchem d’agua.

Tomás sorriu e respondeu:

- Eu também gosto muito dele. Vou ligar para ele semana que vem.

Como era de se esperar, ele não ligou. E eu também não. Nesse orgulho besta que vitimiza muitos de nós, homens.

Eu sabia que Tomás era uma história mal resolvida na minha vida.

Me lembro de um período em que comecei a fumar charuto. E o Tomás me advertia, com a maior cara-de-pau:

- Olha lá, você vai ter câncer na boca.

Eu olhava para o cigarro em sua mão e respondia, com sarcasmo:

- E você vai ter câncer no pulmão, e nós seremos a dupla mais criativa do hospital.

Pois bem, Tomás, não aconteceu assim. Mas quem sabe, daqui a alguns anos, nós seremos a dupla mais criativa do céu.

Um beijo carinhoso de seu eterno dupla, amigo e irmão, CARLOS DOMINGOS"

Carlos Domingos, sócio e diretor de criação da age.

Um comentário:

  1. que história mais lindaaaaaaaaaa!!!
    Por isso que eu digo: deixem de bestagem meu povo. Essa vida é muito curta para nos apegarmos a "aquela palavra" - que linkeiro que é linkeiro sabe que não pode pronunciar" - besta.
    Milucha, muito grata flor. Inspirou meu dia.
    bjocas.

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